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Precisamos aprender a amar

coraçãonamao1O que seria amar? Tal pergunta poderá ter respostas variadas. Ninguém fica inerte diante do termo. Encontramos pessoas que amam, outras que não amam e até gente que não se ama. Neste último caso a vida se torna um enorme peso e é capaz de resultar em um fim funesto.

O amor nunca se equivoca. O que pode conduzir a erro é não amar. Bento XVI em sua encíclica “Deus Caritas Est”, publicada em janeiro de 2016, desenvolve raciocínio de grande profundidade, explicando a autenticidade do amor em três aspectos: amor filia, o amor eros e o amor ágape. O primeiro é o amor fraternal que existe entre os amigos, o segundo, o amor conjugal e o terceiro, o amor mais perfeito, capaz de amar ilimitadamente até mesmo aos que nos causam mal.

Certo dia os fariseus quiseram fazer armadilhas a Cristo a respeito de preceitos religiosos. Um deles lhe perguntou: “Qual é o maior mandamento da Lei?” (Mt 22, 36). Entre os mandamentos judaicos havia 613 preceitos, entre os quais 248 eram indicações comportamentais positivas e 365 eram proibições, tantas como os dias do ano. Isto constituía a Torá (Lei em hebraico), presentes tanto no Pentateuco, como nos escritos na Mishná, das reuniões rabínicas. A resposta de Jesus foi simplesmente explicitação do amor. Ele propõe o ato de amar em dois níveis hierárquicos, mas inseparáveis, embora nas escrituras judaicas estivessem em textos diferentes.

O primeiro amor para Cristo é exclusivo de Deus. Cita o mandamento explícito no Deuteronômio, conhecido de todo bom israelita, que constitui o famoso Shemá, oração repetida todos os dias de manhã e à tarde. “Ouve, Israel, o Senhor teu Deus é o único Senhor! Amarás o Senhor Teu Deus com todo o teu coração, com todas as tuas forças!” (Dt 6, 4-5). Por fim, Cristo cita o livro do Levítico, onde está escrito: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19, 18). A novidade de Cristo é que estes dois mandamentos não existem em separado, indicando que é impossível amar a Deus sem amar o próximo e nem amar o próximo sem a luz do amor a Deus.

O povo de Israel sabia bem que isto é uma verdade, pois no livro do Êxodo está presente o “código da aliança” que determina não maltratar o estrangeiro, nem fazer mal algum às viúvas e nem aos órfãos, nem emprestar dinheiro com usura causando dificuldades para o pobre. Porém, o amor de Cristo vai mais além e supera o princípio do Rabino Hiell, que viveu 20 anos antes de Cristo e que ensinava: “Não faças ao outro o que não queres que o outro faça a ti. Isto resume toda a lei”. O resumo da lei para Cristo não é fazer para obter um bem, mas para oferecer tudo em vista do bem de todos.

O amor verdadeiro supera tudo, suporta tudo, está superior a qualquer circunstância. Mesmo nas ocasiões tormentosas, conserva a perseverança e é incapaz de ceder espaço ao ódio e à vingança. Este é o amor divino à semelhança do qual o Criador nos fez. São Paulo escreve aos Tessalonicenses, elogiando-os por causa do acolhimento da Palavra de Deus com alegria, “apesar de tantas tribulações” (Ts 1, 6), ao ponto de tornarem-se modelo para os fiéis da Macedônia e da Acaia.

Para compreender o amor de Cristo requer-se maturidade, pois contém a mística da cruz. Amar é ofertar-se até à morte, se preciso, a fim de que o outro viva. “Ninguém tem maior amor que aquele que dá a vida pelos irmãos” (Jo 15,12-13). Isso está muito em acordo com o que li no vídeo esta semana, na história de Irena Sendler, que na época louca da ideologia nazifascista, arriscou a vida e conseguiu salvar mais de 2.500 crianças judias da morte. Perguntada porque fez aquilo correndo tanto risco, ela respondeu: “quando eu era criança meu pai sempre me disse que um homem se afogando tem que ser salvo mesmo se você não sabe nadar”.

Santo Antônio Maria Claret, que foi bispo de Cuba no século XIX, fundador da Congregação dos Missionários da Imaculada, ensinava aos membros de sua família religiosa que deveriam arder de caridade para que todas as pessoas, contagiadas pelo amor mútuo, se inflamassem com o fogo do amor divino; que não se amedrontassem com coisa alguma, nem com as penúrias e nem mesmo com as calúnias, e até se alegrassem nos tormentos, imitando a Cristo e sempre preocupados com uma única coisa: a glória e a salvação das pessoas.

A melhor definição de amor, segundo meu parecer, é esta: “Deus é amor e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele” (I Jo 4, 16). Quem desejaria algo melhor?


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

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