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Você pode dormir sossegado?

A greve dos caminhoneiros representa um grito forte da população brasileira diante desta situação insuportável na governança do país. Esse mal não é problema só do governo atual, mas vem nos atormentando há décadas sob a égide da corrupção em todos os partidos. Há impostos demais e há roubalheira desavergonhada do dinheiro que pagamos à nação. Há políticos bons e bem-intencionados, mas que se veem impotentes diante do descalabro.

Tudo isso tira o sono dos brasileiros. Ninguém sabe que medidas seriam as mais acertadas para consertar este país. As opiniões divergem e, em certos casos, são conflitivas.

De minha parte, conclamo os fiéis a não se omitirem da responsabilidade de cidadãos conscientes e participativos através dos meios pacíficos e respeitosos; nunca apelem para lutas de classe, e nunca se deixem fanatizar por ideologias e nem por partidos. Nesta hora grave, se ponham em oração cada vez mais intensa, suplicando à Trindade Santíssima luzes para que se encontre o caminho certo para a superação dos problemas. Que não haja violência nem ódio, nem fome e nem, muito menos, derramamento de sangue. A paz a todos interessa. As soluções bélicas não servem a não ser para destruir e arruinar as famílias.

Mas desejo recordar também de um problema concreto que depende da decisão de cada um e não o consideremos menos importante. É a situação de pobreza, de miséria de muitos de nossos irmãos e que precisam de imediato socorro. A fome, a doença e o frio não podem esperar.

Por causa das graves questões do país, as obras assistenciais estão sem condições de atender a seus assistidos, por falta de alimentos e outros itens indispensáveis. Por exemplo, nosso Instituto Padre João Emilio, onde a Arquidiocese de Juiz de Fora assiste a 135 crianças e suas famílias, teve que fechar suas portas por, ao menos três dias, pois não há alimentos para fornecer. Outras obras tiveram que tomar a mesma decisão. O que cada um pode fazer?

Não há como dormir sabendo que alguém está sofrendo de fome, de dor e de tantos outros problemas e, por causa dos problemas políticos, nem mesmo as instituições que os ajudam podem funcionar.

O frio chegou. Como dormir sossegado, sabendo que há gente ameaçada de doenças e até de morte nas calçadas ou em casas precárias?

Faça uma visita ao seu guarda-roupa e veja quantas peças você não usa ou usa muito pouco e que lhe seriam dispensáveis. Quantos sapatos, sandálias, chinelos, meias, blusas, agasalhos, cobertores que você poderia oferecer para os mais pobres! Há quem diga, e eu concordo, que, se você passou um ano sem usar uma peça de seu vestuário, é porque não precisa dela. Aquela peça não lhe pertence mais. Tenha consciência disso.

Você não pode dormir às soltas, se você não doar ao menos o que lhe sobra, pois alguém está sem dormir justamente porque lhe falta o necessário.

Faça uma visita à sua despensa e à sua geladeira. Talvez aí também haja coisas com que você possa saciar a fome de uma criancinha. Às vezes vejo geladeiras ajuntando tantas sobrinhas que ninguém vai comer a acabarão no lixo. Tenha o costume de dar para os pobres o que você não precisa ajuntar.

Não podemos dormir em paz se alguém está com fome, com sede, necessitado de algo.

Nem quero falar de sua conta bancária! Você saberá se ela também não lhe tira o sono perante a miséria alheia, por exemplo, de gente que no Haiti come terra, ou de pessoas que aqui comem do que tiram no lixo.

Para terminar, quero propor-lhe uma reflexão tirada da Bíblia. É da carta de São Tiago. Diz assim: “E agora, vós, os ricos, chorai e gemei por causa das desgraças que estão para cair sobre vós. Vossa riqueza está apodrecendo e vossas roupas estão carcomidas pelas traças. Vosso ouro e vossa prata estão enferrujadas e a ferrugem deles vai depor contra vós e devorará vossas carnes, como fogo!“ (Tg 5, 1-3).

Podemos dormir sossegados?

Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

Quem é o Espírito Santo?

Após 50 dias, a contar da ressurreição de Jesus, os Apóstolos, reunidos num mesmo lugar, vivenciaram uma experiência nova. Vindo sobre eles como que línguas de fogo, após terem sentido no cenáculo um ruído como o de um vento impetuoso, desapareceram-lhes o medo, o desânimo e a dúvida (Cf. Atos 2, 1-11). De fato, o Senhor Jesus, antes de subir aos céus, lhes havia prevenido: “Tenho ainda muitas coisas a vos dizer, mas não sois capazes de compreendê-las agora. Quando ele vier, o Espírito da Verdade, vos guiará em toda a verdade” (Jo 16, 12-13).

Após aquele Pentecostes, os discípulos saíram da sala da ceia com a certeza inabalável de algumas verdades até então meio obscuras para eles. Não tiveram mais dúvidas de que Cristo era o Messias esperado, compreenderam que Jesus humano era também de natureza divina, e creram, de forma indubitável, que ele havia ressuscitado dos mortos. São Cirilo de Jerusalém (séc. IV) se expressou sobre esta clarividência da seguinte forma: “Quem se encontra nas trevas, ao nascer do sol recebe nos olhos a sua luz, começando a enxergar claramente coisas que até então não via”.

Destas certezas, passaram a ter comportamento diferenciado do período anterior. De medrosos que eram, a ponto de Pedro, primeiro dos Apóstolos, negar seu Mestre diante de uma servente do templo, passaram a atitudes destemidas diante de juízes, magistrados, governadores e outros chefes do povo. Nada mais lhes metia medo e nem lhes impedia de pregar em nome de Cristo, nem a dor, nem a espada, nem tribulação, nem angústia, nem perigo, nem fome (Cf. Rom 8, 35-36).

Como o fogo que se distribui em infinitas chamas sem nada perder de seu calor e de sua luz, nem diminuir de sua inteireza e intensidade original, assim o Espírito Santo os invadiu por inteiro, dando a cada um acolhê-lo conforme a sua necessidade pessoal, como expressou São Basílio Magno: “O Espírito Santo está presente em cada um dos que são capazes de recebê-lo, como se estivesse nele só, e, não obstante, dá a todos a totalidade da graça de que necessitam”.

São Paulo escreve aos Coríntios: “Ignorais, por acaso, que vosso corpo é templo do Espírito Santo, que mora em vós, e que vos é dado por Deus? E, portanto, ignorais também que vós não vos pertenceis a vós mesmos?” (I Cor 6, 19).

Como o vento que não se vê, mas que é constituído de força e de aragem, o Espírito Santo espalha suas sementes por todos os lugares e dá ao fiel a tranquilidade de alma para permanecer no amor e na paz, mesmo quando sopram os ventos da perseguição e do martírio.

O Espírito Santo produz, renova e reforça a unidade dos que creem e se juntam como irmãos. Faz cumprir o desejo expresso na longa oração de Cristo, antes de se entregar aos soldados de Pilatos, quando orou: “Que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em mim e eu em Ti” (Jo 17, 21).

Como ensina o Concilio Vaticano II (1962-65), o “Espírito habita na Igreja e nos corações dos fiéis como em um templo. Neles ora e dá testemunho da adoção de filhos. Conduz a Igreja ao conhecimento da verdade total, unifica-a na comunhão e nos ministérios, ilumina-a com diversos dons carismáticos e hierárquicos e enriquece-a com seus frutos” (Lumen Gentium, 4.12).

No Cenáculo de Pentecostes, encontrava-se, entre os Apóstolos, segundo a narrativa de Lucas no Atos dos Apóstolos (Cf. Atos 1, 14), Maria, a mãe do Senhor que também foi novamente inebriada com a força do alto, como acontecera no dia em que o Arcanjo Gabriel lhe anunciou que seria a Mãe do Salvador. Lá foi concebido o Filho de Deus em seu seio virginal, aqui é gerada a Igreja, Corpo Místico de Cristo. Por este motivo, a Igreja invoca Maria, com o título de Mãe da Igreja, cuja festa litúrgica, por iniciativa do Papa Francisco, será celebrada, pela primeira vez, na Segunda-Feira após o Domingo de Pentecostes.

O Espírito Santo é a alma da Igreja, a força e a luz de cada fiel.


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

Comunicações Sociais. Tudo será verdade?

Definitivamente, estamos na era das comunicações. O mundo está plugado. Coisas incríveis a tecnologia conseguiu, inimagináveis para um passado muito próximo. Porém, a pergunta sobre a verdade no uso destes meios tão avançados é inevitável. Os meios de Comunicações Sociais estão inteiramente a serviço da verdade?

A matéria é examinada pelo Papa Francisco em sua mensagem para o 52º Dia Mundial das Comunicações Sociais que é celebrado sempre no Domingo da Ascensão do Senhor, neste ano, no dia 13 de maio.

Francisco escolheu como tema a palavra de Cristo: “A verdade vos tornará livres” (João 8, 32). Faz séria reflexão sobre o desastre que causam as fake news na vida das pessoas e o prejuízo moral ao próprio mundo das comunicações. A mentira só produz situações degeneradoras, a falsidade destrói a dignidade humana e agride as relações entre as pessoas.

A verdade, contudo, a todos serve e conduz à paz, ao respeito mútuo e ao crescimento humanitário.

Partindo da Bíblia, o Papa recorda que, segundo a descrição do livro do Gênesis, a primeira fake news da história teria sido a tentação sofrida por Adão e Eva, provocados pela serpente, ‘o mais astuto dos animais’ (cf Gen.3, 1-23). Usando de meia verdade e meia mentira, o tentador engana as pessoas, provoca desconfiança onde não havia, induz ao despeito, à inveja, ao orgulho. O pecado inicial introduz o ódio entre irmãos causando o primeiro fratricídio, praticado por Caim contra seu bom irmão Abel. Pelo abuso da comunicação, o maligno faz entrar na história humana a derrocada de toda sorte de mal.

Semear fake news é um dos maiores desserviços à própria obra das comunicações, pois gera desconfiança, fere a ética, provoca ofensas, agride a paz social. Diz o Papa: “nenhuma distorção é inofensiva; antes pelo contrário, fiar-se daquilo que é falso produz consequências nefastas. Mesmo uma distorção da verdade aparentemente leve pode ter efeitos perigosos”.

Uma das características da comunicação de hoje é a rapidez. Tudo é tão veloz que dificilmente se pode controlar a divulgação de uma notícia. A avidez de certas agências em sair à frente, a ser a primeira a dar a notícia, visando sucesso e dinheiro, resulta em grande perigo, pois muitas vezes põe em jogo a veracidade dos fatos e pode moralmente destruir pessoas para sempre, quando publicam supostos crimes, sem comprovação devida. Uma vez dito nos meios ou viralizada nas redes sociais, ninguém mais conseguirá voltar atrás e limpar o nome de quem foi injustamente prejudicado. Isso funciona como as cartas anônimas, pois partem de pessoas inescrupulosas, dotadas de mal caráter e de nenhum espírito cristão. O missivista anônimo age como hipócrita que atira a pedra e esconde a mão. O mesmo se dá com certas acusações graves que são viralizadas, na maioria dos casos, sem se conhecer sua procedência.

O Papa diz: “As fake news tornam-se frequentemente virais, ou seja, propagam-se com grande rapidez e de forma dificilmente controlável”. E mais à frente, diz: “As próprias motivações econômicas e oportunistas da desinformação têm raízes na sede do poder, do ter e do prazer”.

Como remédio principal para vencer o problema das falsas notícias, a mensagem pontifícia propõe duas medidas. A primeira é a educação das pessoas, desde crianças, para que vençam a tentação da mentira, a fim de serem formadas na verdade como uma opção pessoal. A segunda medida prática é não passar para frente, não compartilhar, não dar nenhuma atenção às fake news, mas justamente combater esta prática.


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
Bispo referencial da Comissão para Comunicação e Cultura do Regional Leste 2 da CNBB

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