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ACORDE - Escola de Música Arquidiocesana

DSC 0103Era um sonho nosso. As crianças do Instituto Padre João Emilio não poderiam ficar desamparadas em sua adolescência. Terminando sua participação no projeto de reforço escolar, turno e contraturno, aos onze anos, deveriam se desligar da casa que as acolhe com carinho. Idealizamos, então, a Escola Arquidiocesana de Música, como ação social com o nome de “Projeto Acorde”, cuja inauguração se deu na última quinta-feira, dia 28 de março de 2019.

O primeiro objetivo é oferecer, sobretudo a tais jovens, em situação de vulnerabilidade social, uma oportunidade de fazer um caminho formativo que poderá ajudá-los a cultivar valores humanos e abrir possibilidades profissionais para o futuro. Oferecer-lhes experiências que os edifique pela força harmonizadora da música é crer que os elementos desta arte têm muito o que ensinar para a vida. Ela tem o condão de encantar, de empolgar, além de ocupar o tempo com suas naturais exigências, ajudando os que a escolhem a estar em lugar seguro, sem os perigos da violência, da degeneração moral, e de outros problemas próprios da ociosidade ou das organizações criminosas hoje existentes. A volta das crianças para um meio tão vulnerável poderia representar um risco para o trabalho realizado.

“Acorde” é um nome sugestivo de muitos significados. É, inicialmente, um conjunto de notas musicais que unidas resultam numa beleza que individualmente nem de longe alcançariam. Cada umas das notas sede seu pequeno som à outra como que se escondendo para que, unidas, alcancem algo infinitamente melhor. O acorde perfeito maior, Dó, Mi, Sol, Dó funciona como lição de vida para quem participa de projeto como este. “Acorde” é também um tempo verbal. Quer despertar para um problema grave à sociedade que é a marginalidade, a pobreza, a carência que, às vezes, leva à delinquência. “Acorde”, em latim, sugere “ao coração”, lugar principal da obra de nosso Instituto e de nossa Arquidiocese.

O projeto vem também como ação litúrgica, onde se dá a Deus o culto mais elevado do coração humano. Já havíamos fundado o Coral Benedictus em 2011 e este está em pleno sucesso. Com o atual projeto, esperamos oferecer à Igreja da Região a formação de uma boa orquestra que cultive a arte que enleva e tem o poder de criar a paz.


Dom Gil Antônio Moreira

Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

Conversão: Ato que Liberta

Sarça-ardente-e-MoisésUm dos movimentos da alma humana na Quaresma deve ser a revisão de vida. Por ela se enxerga o que de bom já se realizou e percebe-se o que existe ainda de omissão ou de erros que precisam ser corrigidos. Ao fiel, resta a confiança em Deus, para empreender, com humildade, o caminho da conversão, não obstante cruzes que isso possa significar.

Na experiência do povo de Israel, segundo as narrativas bíblicas, encontram-se fatos e reações importantes que ajudarão no processo de transformação interior. No Monte Horeb, Moisés experimentou a bondade e a beleza de Deus. Na solidão das alturas geográficas, vê uma sarça que arde em fogo, mas não se destrói. Ouve uma voz que lhe diz: “Não te aproximes. Tira as sandálias, pois o chão que tu pisas é sagrado”. Com coração palpitante, diante do inaudito, ouve a revelação: “Eu sou o Deus de teus pais, de Abraão, de Isaac e de Jacó” (Ex 3, 6). Sentiu em si o mesmo que dizer: ‘sou Deus fiel que não se esquece de seus amigos do passado nem do bem realizado. Sou perene, perpétuo e pronto para fortalecer aquele que segue os meus mandamentos’.

Por este episódio, descobre-se que há um solo sagrado a ser pisado pelos pés humanos, tão frágeis, marcados pelos descaminhos do pecado, pelas infidelidades contra o boníssimo Deus. Aprende-se que há distância entre a frágil criatura e a fortaleza eterna do Criador, porém que não impede a misericórdia e a bênção regeneradora. Tirar as sandálias significa desfazer-se de suas coisas terrenas, rever por onde seus pés andaram e voltar a pisar em solo seguro. Converter-se significa aproximar-se do sobrenatural até o ponto que seja permitido pela natureza das coisas e as diferenças dos seres, e sentir o calor luminoso de Deus, que queima, mas não destrói. Exige, mas não derrota.

A conversão toma contornos de perfeição quando Deus se aproxima dos seres humanos, enviando Seu Filho para indicar a estrada da verdade. Ele morrerá na cruz em lugar dos pecadores, mas exigirá conversão, como afirma, exemplificando com desastres que causaram mortes de inocentes: “Se não vos converterdes, morrereis todos do mesmo modo” (Lc 13, 1-3).

Cristo apresenta ao pecador um Deus paciente que é capaz de aguardar três anos e mais um para que a figueira dê frutos (cf. Lc 13, 8). Porém, o processo de conversão requer ato de decisão, pois sua misericórdia não pode ser confundida com licenciosidade, como ensina a Sagrada Escritura: “Não digas: ‘Pequei: o que me aconteceu?’ porque o Senhor é paciente. Não sejas tão seguro do perdão para acumular pecado sobre pecado. Não digas: ‘Sua misericórdia é grande para perdoar meus inúmeros pecados’, porque há nele misericórdia e cólera e sua ira pousará sobre os pecadores. Não demores em voltar para o Senhor e não adies de um dia para o outro, porque, de repente, a cólera do Senhor virá e no dia do castigo perecerás” (Eclo 5,4-7).

Chiara Lubich escreveu: “O perdão não é esquecimento (…), não é fraqueza (…), não consiste em afirmar que não tem importância aquilo que é grave, ou bom aquilo que é mau (…), não é indiferente” (C. Lubich, Costruire sulla Roccia, Città Nuova, Roma 1994. Citada em Palavra de Vida- Março 2019).

Converter-se é tomar novo caminho, subir a montanha da superação, é corajosamente renunciar ao erro e abraçar a salvação. Deus espera o retorno do contrito e lhe falará amorosamente na sarça ardente do solo sagrado. Afinal, “há mais alegria no céu por um só pecador que se converta, que por noventa e nove justos que não precisam de conversão” (Lc 15, 7).

Converter-se é o mesmo que libertar-se.


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

Brumadinho, até quando?

Brumadinho-Foto-UOLFaz um mês. É de cortar o coração. As imagens são impressionantes e fazem chorar. É sofrimento a céu aberto. A angústia das famílias, das pessoas, da comunidade, da cidade inteira, de um Estado e de um País, que já haviam assistido cenas parecidas, há três anos, interroga à mente: até quando? O massacre foi cruel, crudelíssimo! Há, contudo, um cenário que é invisível: o que se passa na mente e no coração de quem perdeu entes queridos, e pior, que os perdeu e os corpos não foram achados. Este drama somente os travesseiros podem perceber. A angústia fere mais depois que a imprensa foi embora, os socorristas estão longe e o silêncio invadiu a noite. Até quando? O desastre, que poderia ter sido evitado, destruiu de forma irreparável as casas das famílias, construídas com sacrifícios de muitos anos, grande parte da natureza, do rio, de mais de cem ou duzentas pessoas que não voltaram para casa e nunca mais farão este caminho. A busca hercúlea dos bombeiros, dos trabalhadores, dos voluntários na ânsia de encontrar corpos para que possam ser sepultados dignamente, religiosamente, assusta a mente dos comodistas ou derrotistas. Mas, até quando? Todos os corações sensíveis, movidos pela fé e pelo amor ao próximo, não se darão o direito de ficar parados. Ao menos um pouco cada um pode fazer. Ao imaginar que, aos poucos, as notícias cessarão, o assunto ficará cada vez mais reduzido às estreitas fronteiras do local do acidente, as soluções e as reparações que a empresa responsável demorará a cumprir, fico a pensar: até quando? Até quando as visitas humanitárias, fraternais perdurarão?

Certamente, os feridos no corpo ou na alma, derramarão lágrimas furtivas, e terão espadas de dor atravessadas na alma que poucos perceberão. Até quando? Bem-aventurados os que, após o silenciar da mídia, continuarão a ser solidários e não cessarão de agir como irmão oferecendo seus braços para ajudar e seus ombros para alguém chorar.

Impressiona à alma a programação celebrativa deste final de semana, na Paróquia de São Sebastião de Brumadinho que, nos três últimos dias reúne fiéis, do alvorecer à noite, para orar, ouvir a Palavra de Deus, comungar o Corpo do Senhor, afinal celebrar a dor e a vitória do espírito sobre o mal e a morte. É fundamental clamar a Deus, agarrar-se a ele, agradecer-lhe pela sua atenção nestes momentos que parecem não ter fim.

A presença do Núncio Apostólico, embaixador no Papa no Brasil, para a Missa deste dia 25, significará a esperança da Igreja que crê na ressurreição e superação de todo erro, eliminando afinal, a força inexorável da morte. “Onde está tua vitória, ó morte? ” (Oz 13,14)

Dia 27, representantes do episcopado mineiro se reunirão com o Governador do Estado, Romeu Zema e estudarão medidas para acudir as famílias, e ver atitudes preventivas para que não aconteçam mais desastres evitáveis, com ninguém.

Protestos e clamores invadem ruas da capital mineira, percorrem vales e colinas, chamando à atenção pela despreocupação com os seres humanos, dos que parecem visar apenas o lucro. Vale e outros. A estes, Cristo proclama novamente: “Ai de vós, ricos, porque já recebestes vossa consolação” (Lc 6,24). Virgílio grita outra vez “auri sacra fames” protestando contra a execranda fome pelo vil metal.

Até quando! Certamente esta pergunta soará como ostinato nos peitos dos que sofrem, dos que socorrem, dos que creem, dos que amam, dos que são inconformados com as injustiças e não se darão ao luxo de ficar parados diante de tragédias, vendo os que morrem, sofrendo com os que sofrem.

Ergo os olhos para o céu e rezo com todo as vísceras do meu ser: “Do abismo profundo, clamo a vós, Senhor! Escuta meu clamor. Que teus ouvidos estejam atentos ao clamor da minha prece. ”

É forçoso concluir com a vítimas do lamaçal: sei que um dia viverei na terra dos vivos e cantarei as alegrias do meu povo, louvando livremente o Senhor!


Dom Gil Antônio Moreira

Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

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