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Vivendo e vencendo o luto em tempos de covid

luto-300x300“O Senhor está perto dos contritos de coração, e salva os que têm o espírito abatido” (SL 33,19)

A pandemia trouxe à tona duas situações antagônicas: do individualismo desenfreado passou-se a pensar como uma sociedade coletiva. Do eu ao nós, onde todos passaram a ser responsáveis uns pelos outros. Tão acostumados estávamos a pensar somente em nossas necessidades e desejos que, assombrados por um vírus invisível, mas de profunda força destruidora, fomos forçados a rever nossas prioridades e o modo como enxergamos a vida e o que fazemos dela. Percebemos que somos frágeis, suscetíveis demais aos acontecimentos contemporâneos e, o que mais gera medo e incertezas: percebemos que somos finitos. Tomamos consciência de que a morte, a dor e o luto são mais próximos de nós do que gostaríamos ou imaginávamos que fossem.

No começo, as mortes eram esporádicas e distantes de nós, mas, ao passar do tempo a doença e suas consequências chegaram muito perto: da morte de pessoas desconhecidas e distantes, muitos de nós sofreram na alma e no coração a perda de alguém bem próximo, familiares, amigos, filhos, pais, enfim, as perdas de vidas ligadas à nossa intimidade cotidiana. E a morte desencadeia inúmeras sensações, às quais denominamos luto, e nele está embutido vários sentimentos, que podem diferir de pessoa para pessoa, mas que no final, demonstra a dor da perda e da separação total.

O luto é um sentimento extremamente pessoal e particular e vivê-lo é essencial para dar continuidade à vida. Elaborar o luto é viver os sentimentos da forma como eles são: uns choram, outros se reservam no silêncio, alguns necessitam falar e expressar seus sentimentos, outros ainda se revoltam, se enraivecem ou se isolam. Cada ser humano tem um jeito próprio de viver esse tempo de tristeza e pesar. Viver o luto é um processo e cada pessoa tem seu tempo e seu espaço para superar, passo à passo e poder retornar ao cotidiano. Embora a morte seja uma certeza para todos, a verdade é que ninguém está preparado para perder o outro nem tão pouco para desapegar facilmente de quem lhe é próximo. Se sentimos a morte de tantas pessoas desconhecidas pela covid, quanto mais será dolorido a partida dos que estão ao nosso lado. Há que se compreender que o luto não é uma doença e sim uma resposta natural a um evento traumático da vida.

As tristes experiências da supressão ou da inexistência dos rituais fúnebres, velórios e despedidas, onde o consolo dos abraços dos amigos e familiares, as palavras de conforto, as orações e exéquias serviam de bálsamo e alento, deixou exposto, de forma límpida, a importância espiritual e psicológica das cerimonias fúnebres de despedidas. Seguir em frente é necessário e, sem esses rituais importantes devemos enxergar outras formas de viver esse momento, lembrando que o conforto espiritual é essencial também nessas situações de dor e tristeza, pois é a fé que sustenta a caminhada sem a presença da pessoa da qual sentimos falta.

Não devemos morrer de saudades e sim, viver a saudade fazendo memórias e lembrando dos bons momentos, passagens felizes, frases marcantes, também recordando dos ensinamentos recebidos; oferecer missas e orações pelas almas é uma forma de querer bem e desejar que elas encontrem a alegria de estarem na eternidade com o Criador, e agradecer a Deus pelo privilégio de ter vivido com essa pessoa, são formas de amenizar a dor da falta de despedida. Também faz parte perdoar as mágoas e não se culpar pelo que poderia ter feito e não fez, perdoando-se e perdoando quem já se foi. É salutar também partilhar a tristeza, sem medo e sem constrangimento de chorar e pôr para fora o que sufoca o coração. Lembremos que Cristo, imensamente comovido pela dor dos familiares e amigos, também chorou a morte de Lázaro, seu amigo (Jo 11,35).

Passando por várias fases, chega o momento da aceitação do fato em si mesmo, quando em paz e com serenidade, o espaço vazio causado pela perda é preenchido pela esperança, pela certeza da comunhão dos santos e da feliz ressurreição em Cristo Jesus. “Eis que estou convosco todos os dias, até o final dos tempos” (Mt 28, 20). Mais que um ensinamento de Jesus, é uma promessa. Em toda e qualquer situação não estamos sozinhos, o Próprio Cristo está conosco, nos ajudando a carregar o peso das nossas dores e aflições, lembrando que tudo é passageiro, inclusive nossa vida e nossos sofrimentos. Pela sua Morte na Cruz, Jesus Cristo nos garantiu a graça de, juntos com Ele, vivermos por toda eternidade. Vida e morte caminham juntas, e é a morte que faz a vida ser valiosa e melhor vivida, se queremos entrar em comunhão com Jesus, no Reino Eterno. Amparados no abraço maternal da Virgem Maria, coloquemos em Seu colo santo a vida dos que partiram antes de nós, na certeza de que a morte não é o fim, e sim nossa entrada na Pátria Celeste, onde, com os santos e santas, contemplaremos Jesus face a face. Vivamos o hoje com fé e esperança, na certeza da presença de Cristo em meio a nós, pois sua misericórdia é infinita.


Dom Carlos José
Bispo de Apucarana (PR)

“Coragem, levanta-te, Jesus te chama!”

cego-de-JericóO Evangelista Marcos 10,46-52 relata o momento decisivo da vida de Bartimeu. Um encontro pessoal e direto com Jesus intermediado por outras pessoas que caminhavam com Ele passando por Jericó. A cegueira de Bartimeu fez dele um homem marginalizado, um mendigo à beira do caminho. Estava isolado duplamente: por não ver, não estar e caminhar com os outros. A estrada é meio de comunicação, lugar de passagem, lugar para aqueles que veem, trabalham e tem pressa para chegar. O único contato que Bartimeu tem com os outros é na forma de dependência pelas esmolas. É uma relação de benfeitor e beneficiado. Estava condenado a uma passiva resignação.

Porém, um imprevisível encontro começou a mudar a sua vida. Bartimeu ouviu que Jesus estava passando e começa a gritar: “Jesus, Filho de Davi, tem piedade de mim!” Esta oração, em forma de grito, chega aos ouvidos de Jesus que se comove. O grito equivale a um último recurso, um socorro, uma explosão de energia represada, uma manifestação barulhenta para ser notado.

Jesus ouve e para. Não é surdo, nem de ouvidos e nem de coração, e o manda chamar. Quer estabelecer uma relação e por isso proporciona um encontro, no meio da rua e da multidão, como se estivesse em casa. Parou interessando-se por aquele que estava gritando, quer aproximação física. O marginalizado muda de postura: de sentado passa a ficar em pé, passa da beira da estrada para o seu meio, de gritar passa a dialogar.

Jesus sabia o que Bartimeu queria, mas pergunta. “O que queres que eu te faça?” Deus deseja que o homem fale, expresse o que se passa por dentro, fale como pessoa livre, face a face. Jesus quer entrar na vida dele, participar dos seus problemas e sonhos pela porta da frente para tirá-lo do isolamento. Somente a seguir recupera a visão. Neste breve fato aparecem valores fundamentais da dignidade humana: inclusão social, autonomia, ser escutado, dialogar, caminhar com os outros na estrada do mundo.

O evangelista Marcos registra que, depois destes fatos, Bartimeu “seguia Jesus”. Na cura Jesus tinha dito “vai”, não o convidou para segui-lo, nem recebeu uma missão específica. Agora, com autonomia e capacidade de decisão, Bartimeu começou a seguir Jesus.

Apareceu um novo missionário. Bartimeu aprendeu que a lógica da missão é uma resposta de gratidão ao encontro com Cristo. O mês missionário de 2021 tem como tema “Jesus Cristo é missão” e por lema: “Não podemos deixar de falar sobre o que vimos e ouvimos” (Atos 4,20).

Bartimeu tinha ouvido falar de Jesus. Foi o ponto de partida para que gritasse para receber atenção e proporcionar um encontro pessoal. É a trajetória da fé. O encontro com Jesus Cristo é intermediado. Quem teve um encontro profundo e transformador sente-se, como um gesto de gratidão, convidado a contar aos outros o que viu e ouviu.

A partilha é um ato de amor ao próximo, um desejo que Deus participe da vida pessoal e comunitária, esteja presente nas alegrias e dores, nos desejos e angústias. No relato do Bartimeu, os que estavam com Jesus, num primeiro momento impediram que gritasse. Mudaram de postura quando Jesus o chama para si. Jesus pede o mesmo para nós, que nos consideramos mais próximo dele, isto é, sermos instrumentos de aproximação. O encontro pessoal com Cristo resultará em transformações, em conversão.


Dom Rodolfo Luís Weber
Arcebispo de Passo Fundo (MG)

A luz de Jesus precisa estar acesa dentro de nós

homilia 19-10“Que vossos rins estejam cingidos e as lâmpadas acesas” (Lucas 12,35).


Precisamos ser, de fato, operários da messe do Senhor com toda a prudência e determinação que se exige de um bom operário; aqueles homens que estão esperando o seu senhor voltar da festa de casamento para abrir imediatamente a porta, e nós não podemos estar dormindo, não podemos estar cochilando, não podemos estar vacilando. É preciso a todo momento estarmos cuidando de nós mesmos. E cingir os rins é dizer: “Estou atento”, “Estou ligado e conectado à graça”, para que a gente não se desvie, para que não estejamos naquele estado de dormência e nos deixemos levar pelos tempos em que estamos.

Aqui não só os rins cingidos, mas as lâmpadas acesas, porque, se você apaga a lâmpada do interior, da alma e do coração, o coração vai para a escuridão, e é o que acontece quando apagamos a luz do nosso quarto e queremos levantar, vamos tropeçar se não estivermos com a luz acesa. Não dá para caminhar na escuridão, não só tropeçamos, mas caímos, machucamos e tantas tragédias e desastres acontecem.

Permitamos que a luz de Jesus esteja nos conduzindo e não permaneçamos nas trevas e nem na escuridão

Imagina caminharmos na escuridão da alma. Jesus é a luz do mundo, é sua luz que precisa estar em nós para sermos lâmpadas acesas, iluminando os caminhos por onde estamos andando para não caminharmos nas trevas, para não caminharmos na escuridão, para não nos perdermos nas estradas do mundo, nos nossos pensamentos, nos nossos sentimentos porque as tentações vêm para dentro de nós.

Às vezes, temos um mau pensamento, temos um mau sentimento, às vezes, vem dentro de nós um sentimento negativo e ruim, em vez de pegarmos a luz, que é Jesus, e acender dentro de nós e incendiar o nosso coração, deixamo-nos conduzir por esse sentimento, por esse pensamento e vamos nos envolvendo em coisas obscuras; e, quando vemos, estamos nas trevas, os rins não estão cingidos e as lâmpadas não estão acesas.

Não importa a hora que o Senhor venha, não importa a hora que tenhamos que sair desse mundo, seja de manhã, à tarde ou à noite, de madrugada ou ao anoitecer, é importante não deixar a alma escurecer, é importante não deixar que o nosso coração se leve pelas trevas. Passamos pelas amarguras da vida, pelas noites escuras da alma, mas, na noite mais escura da alma, no sofrimento mais duro que possamos passar nessa vida, permitamos que a luz de Jesus esteja nos conduzindo e não permaneçamos nas trevas nem na escuridão, mas que a luz de Jesus nos dê a direção da vida e do coração.

Deus abençoe você!


Padre Roger Araújo
Sacerdote da Comunidade Canção Nova, jornalista e colaborador do Portal Canção Nova

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